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Wörziech May 2014
Mil-réis entre réis pagos pelo algodão e pelo o material sinteticamente enfadonho – ambos traçados na sala abafada em que, agora, a escuridão de frequência vibrante busca-me, parado, observando o sangue que segue, que traça, desenha os seus próprios afluentes em uma elaborada figura de empalhamento. Tropeço por entre galhos, perco um ou outro membro e abro os olhos. Agora, veja! Eles estão lá! Meus membros estão lá! Mas atente-se! Aquele, meio torto, veja-o com perfeição.
Digo, eram meus. Sim, pois agora a este outro pertence.  Está lá, na poça de meu sangue, com a minha própria estrutura, o que parece ter sido um simpático palhaço. Confirmo aquela minha primeira impressão: empalhado palhaço. Agora há algo dentro daqueles membros. Definitivamente há! Até vejo alguma perenidade por entre as articulações, à mostra - resultado de um trabalho mal feito pelo meu próprio líquido vermelho intenso.
Depois de muito apreciar minhas partes nunca tão bem aproveitadas, vejo algo mais além - vejo asas! Inicialmente, um âmago bastante ridículo e tedioso - mas observando mais atentamente, percebo profundamente que aquela minha obra orgânica possui, como verdadeira essência, o plano mais ao fundo, que não só se colocava de forma discreta, como aspirava se esconder do foco do olhar, retirando nitidez que a ele é supostamente é inerte. Percebi a explicação para minha atrapalhada e inconsciente criação. Humano algum será capaz de apreciá-la como eu aprecio. Amo-a agora como amo a morte! E morta está minha obra, afastada para sempre de mim. Assim como os meus olhos e libido.

*É um sangue amaldiçoado aquele que escorrera de mim, seria está a plausível explicação? Sequer traçara ele uma imagem de uma mecânica funcional.
não desaprendo o amor pelo sonho
surge-se-me belo e ardente
pelo olhar de dentro
da alma, o amor,
pelo rosto da mulher-anjo.

sei quem é e que a amo
quer porque lho digo,
quer porque o sinto
pela ausência que me arde
as entranhas.

sei quem é e que a amo,
sei que o que é, é mais que ser mulher
sei-a água na essência,
incêndio e vento na ausência
sei
que a não posso conhecer.
Danielle Furtado Nov 2014
Nasceu no dia dos namorados. Filho de mãe brasileira com descendência holandesa e pai português. Tinha três irmãos: seu gêmeo Fabrício, o mais velho, Renato, e o terceiro, falecido, que era sua grande dor, nunca dizia seu nome e ninguém se atrevia a perguntar.
A pessoa em questão chamaremos de Jimmy. Jimmy Jazz.
Jimmy morava em Portugal, na cidade de Faro, e passou a infância fazendo viagens ao Brasil a fim de visitar a família de sua mãe; sempre rebelde, colecionava olhares tortos, lições de moral, renegações.
Seu maior inimigo, também chamado por ele de pai, declarou guerra contra suas ideologias punk, seu cabelo que gritava anarquismo, e a vontade que tinha ele de viver.
Certo dia, não qualquer dia mas no natal do ano em que Jimmy fez 14 anos, seu pai o expulsou de casa. Mais um menino perdido na rua se tornou o pequeno aspirante à poeta, agora um verdadeiro marginal.
Não tinha para onde ir. Sentou-se na calçada, olhou para seus pés e agradeceu pela sorte de estar de sapatos e ter uma caneta no bolso no momento da expulsão, seu pai não o deixara com nada, nem um vintém, e tinha fome.
Rondou pelas mesmas quadras ao redor de sua casa por uns dias, até se cansar dos mesmos rostos e da rotina daquela região, então tomou coragem e resolveu explorar outras vidas, havia encontrado um caderno em branco dentro de uma biblioteca pública onde costumava passar o dia lendo e este seria seu amigo por um bom tempo.
Orgulhoso, auto-suficiente, o menino de apenas 14 anos acabou encontrando alguém como ele, por fim. Seu nome era Allan, um punk que, apesar de ainda ter uma casa, estava doido para ir embora viver sua rotina de não ter rotina alguma, e eles levaram isso muito à sério.
Logo se tornaram inseparáveis, arrumaram emprego juntos, que não era muito mas conseguiria mantê-los pelo menos até terminarem a escola, conseguiram alugar uma casa e compraram um cachorro que nunca ganhou nome pois não conseguiam entrar em acordo sobre isso, Jimmy tinha também um lagarto de estimação que chamava de Mr. White, sua paixão.
Os dois amigos começaram a frequentar o que antes só viam na teoria: as festas punk; finalmente haviam conseguido o que estavam procurando há tempos: liberdade total de expressão e ação. Rodeados por todos os tipos de drogas e práticas sexuais, mas principalmente, a razão de todo o movimento: a música.
Jimmy tinha inúmeras camisetas dos Smiths, sua banda favorita, e em seu quarto já não se sabia a cor das paredes que estavam cobertas por pôsteres de bandas dos anos 80 e 90, décadas sagradas para qualquer amante da música e Jimmy era um deles, sem dúvida.
Apesar da vida desregrada que levava com o amigo, Jimmy conseguiu ingressar na faculdade de Letras, contribuindo para sua vontade de fazer poesia, e Allan em enfermagem. Os dois, ao contrário do que seus familiares pensavam, eram extremamente inteligentes, cultos, criaram um clube de poesia com mais dois ou três amigos que conheceram em uma das festas e chamaram de "Sociedade dos Poetas Mortos... e Drogados!", fazendo referência ao filme de  Peter Weir.
O nome não era apenas uma piada entre eles, era a maior verdade de suas vidas, eles eram drogados, Jimmy  era viciado em heroína, Allan também mas em menos intensidade que seu parceiro.
Jimmy não era hétero, gay, bissexual ou qualquer outra coisa que se encaixe dentro de um quadrado exigido pela sociedade, Jimmy era do amor livre, Jimmy apenas amava. E com o passar o tempo, amava seu amigo de forma diferente, assustado pelo sentimento, escondeu o maior tempo que pôde até que o sentimento sumisse, afinal é só um hormônio e a vida voltaria ao normal, mas a amizade era e sempre seria algo além disso: uma conexão espiritual, se acreditassem em almas.
Ambos continuaram suas vidas sendo visitados pela família (no caso de Jimmy, apenas sua mãe) duas vezes ao ano, no máximo, e nesses dias não faziam questão de esconderem seus cigarros, piercings ou qualquer pista da vida que levavam sozinhos, afinal, não os devia mais nada já que seus vícios, tanto químicos quanto musicais, eram bancados por eles mesmos.
Era 14 de fevereiro e Jimmy completara 19 anos, a vida ainda era a mesma, o amigo também, mas sua saúde não, principalmente sua saúde mental.
O poeta de sofá, como alguns de nós, sofria de um existencialismo perturbador, o mundo inteiro doía no seu ser, e não podia fazer muito sobre aquilo, afinal o que poderia fazer à respeito senão escrever?
Até pensou em viver de música já que tocava dois instrumentos, mas a ideia de ter desconhecidos desfrutando ou zombando dos seus sentimentos mais puros não lhe era agradável. Continuou a escrever sobre suas dores e amores, e se perguntava por que se sentia daquela forma, por que não poderia ser como seu irmão que, apesar de possuírem aparência idêntica, eram extremos do mesmo corpo. Fabrício era apenas outro cidadão português que chegava em casa antes de sua mãe ficar preocupada, não que ele fosse um filho exemplar, ele só era... normal, e era tudo que Jimmy não era e jamais gostaria de ser; aliás, ter uma vida comum era visto com desprezo pelos olhos dele, olhos que, ainda tão cedo, haviam visto o melhor e o pior da vida, já não acreditava em nada, nem em si mesmo, nem em deus, nem no universo, nem no amor.
Como poderia alguém amar uma pessoa com tanta dor dentro de si? Como ele explicaria sua vontade de morrer à alguém que ele gostaria de passar a vida toda com? Era uma contradição ambulante. Uma contradição de olhos azuis, profundos, e com hematomas pelo corpo todo.
Aos 20 anos, o tédio e a depressão ainda controlavam seu estado emocional a maior parte do tempo, aos domingos era tudo pior, existe algo sobre domingo à tarde que é inexplicável e insuportável para os existencialistas, e para ele não seria diferente. Em um domingo qualquer, se sentindo sozinho, resolveu entrar em um chat online daqueles famosos, e na primeira tentativa de conversa conheceu uma moça do Brasil, que como ele, amava a banda Placebo e sendo existencialista, também sofria de solidão, o que facilitou na construção dos assuntos.
Ela não deu muita importância ao português que dizia "não ser punk porque punks não se chamam de punks", já estava cansada de amores e amizades à distância, decidiu se despedir. O rapaz, insistente e talvez curioso sobre a pessoa com quem se deparara por puro acaso, perguntou se poderiam conversar novamente, e não sabendo a dor que isso a causaria, cedeu.
Assim como havia feito com Allan, Jimmy conquistou Julien, a nova amiga, rapidamente. De um dia para o outro, se pegou esperando para que Jimmy voltasse logo para casa para que pudessem conversar sobre poesia, música, começo e fim da vida, todos os porquês do mundo em apenas uma noite, e então perceberam que já não estavam sozinhos, principalmente ela, que havia tempo não conhecia alguém tão interessante e único quanto ele.
Não demorou muito para que trocassem confidências e os segredos mais íntimos, mas nem tudo era tão sério, riam juntos como nunca antes, e todos sabem que o caminho para o coração de uma mulher é o bom humor, Julien se encontrava perdidamente apaixonada pelo ****** que conhecera num site de relacionamentos e isso se tornaria um problema.
Qualquer relacionamento à distância é complicado por natureza, agora adicione dois suicidas em potencial, um deles viciado em heroína e outra que de tão frustrada já não ligava tanto para sede de viver que sentia, queria apenas ler poesia longe de todas as pessoas comuns, essas que ambos abominavam.
Jimmy era todos os ídolos de Julien comprimidos dentro de si. Ele era Marilyn Manson, era Brian Molko, era Gerard Way, Billy Corgan, Kurt Cobain, mas acima de todos esses, Jimmy era Sid Vicious e Julien sonhava com seus dias de Nancy.
Ele era o primeiro e último pensamento dela, e se tornou o tema principal de toda as poesias que escrevia, assim como as que lia, parecia que todas eram sobre o luso-brasileiro que considerava sua cópia masculina. Jimmy, como ela, era feminista, cheio de ideologias e viciado em bandas, mas ao contrário dela, não teria tanto tempo para essas coisas.
Estava apaixonado por um rapaz brasileiro, Estêvão, que também dizia estar apaixonado por ele mas nunca passaram disso, e logo se formou um semi-triângulo amoroso, pois Julien sabia da existência da paixão de Jimmy, mas Estêvão não sabia que existia outra brasileira que amava a mesma pessoa perdidamente. Não sentiu raiva dele, pelo contrário, apoiava o romance dos dois já que tudo que importava à ela era a felicidade de Jimmy, que como ela, era infeliz, e as chances de pessoas como eles serem felizes algum dia é quase nula.
O brasileiro era amante da MPB e da poesia do país, assim como amava ouvir pós-punk e escrever, interesses que eram comum aos três perdidos, mas era profissional para ele já que conseguira que seus trabalhos fossem publicados diversas vezes. Se Jimmy era Sid Vicious, Julien desejava ser Nancy (ou Courtney Love dependendo do humor), Estêvão era Cazuza.
Morava sozinho e não conseguia se fixar em lugar algum, estava à procura de algo que só poderia achar dentro dele mesmo mas não sabia por onde começar; convivia com *** há alguns meses na época, mas estava relativamente bem com aquilo, tinha um controle emocional maior do que nosso Sid.
Assim como aconteceu com Allan e Julien, não demorou muito para que Estêvão caísse nos encantos de Jimmy, que não eram poucos, e não fazia mais tanta questão de esconder o que sentia por ele. Dono de olhos infinitamente azuis, cabelo bagunçado que mudava de cor frequentemente, corpo magro, pálido, e escrevia os versos mais lindos que poderia imaginar, Jimmy era o ser mais irresistível para qualquer um que quisesse um bom tema para escrever.
--
Julien era de uma cidade pequena do Brasil, onde, sem a internet, jamais poderia ter conhecido Jimmy, que frequentava apenas as grandes cidades do país. Filha de pais separados, tinha o mesmo ódio pelo pai que ele, mas diferente do amigo, seu ódio era usado contra ela mesma, auto-destrutiva é um termo que definiria sua personalidade. Era de se esperar que ela se apaixonasse por alguém viciado em drogas, existe algo de romântico sobre tudo isso, afinal.
Em uma quarta-feira comum, antecipada por um dia nublado, escreveu:

Minhas palavras, todas tiradas dos teus poemas
Teu sotaque, uma voz imaginada
Que obra de arte eram teus olhos
Feitos de um azul-convite

E eu aceitei.


Jimmy era agora seu mundo, e qualquer lugar do mundo a lembrava dele. Qualquer frase proferida aleatoriamente em uma roda de amigos e automaticamente conseguia ouvir sua opinião sobre o assunto, ela o conhecia como ninguém, e em tão pouco tempo já não precisavam falar muita coisa, os dois sabiam dos dois.
Desejava que Jimmy fosse inteiramente dela, corpo e mente, que cada célula de seu ser pudesse tocar todas as células do dela, e que todos os pensamentos dele fossem sobre amá-la, mas como a maioria das coisas que queria, nada iria acontecer, se achava a pessoa mais azarada do mundo (e provavelmente era).
Em uma noite qualquer, após esperar o dia todo ansiosa pela hora em que Jimmy voltaria da faculdade, ele não apareceu. Bom, ele era mesmo uma pessoa inconstante e já estava acostumada à esse tipo de surpresa, mas existia algo diferente sobre aquela noite, sabia que Jimmy estava escondendo alguma coisa dela pois há dias estava estranho e calado, dormia cedo, acordava tarde, não comia, e as músicas que costumavam trocar estavam se tornando cada vez mais tristes, mas era inútil questionar, apesar da intimidade, ele se tornara uma pessoa reservada, o que era totalmente compreensível.
Após três ou quatro dias de aflição, ele finalmente volta e não parece bem, mesmo sem ver seu rosto, conhecia as palavras usadas por ele em todos os momentos. Preocupada com o sumiço, foi logo questionando sua ausência com certa raiva e euforia, Jimmy não respondia uma letra sequer. Julien deixou uma lágrima escorrer e implorou por respostas, tinha a certeza de que algo estava muito errado.
"Acalme-se, ou não poderei lhe contar hoje. Algo aconteceu e seu pressentimento está mais que correto, mas preciso que entenda o meu silêncio", disse à ela.
Julien não respondeu nada além de "me dê seu número, sinto que isso não é algo que se conta por escrito".
Discando o número gigantesco, cheio de códigos, sabia que assim que terminasse aquela ligação teria um problema muito maior do que a alta taxa que é cobrada por ligações internacionais. Ele atendeu e começou a falar interrompendo qualquer formalidade que ela viria a proferir:

– Apenas escute e prometa-me que não irá chorar.
Ela não disse nada, aceitando a condição.
– Há tempos não sinto-me bem, faço as mesmas coisas, não mudei meus costumes, embora deveria mas agora é tarde demais. Sinto-me diferente, meu corpo... fraco. Preciso te contar mas não tenho as palavras certas, acho que nem existem palavras certas para o que estou prestes à dizer então serei direto: descobri que sou *** positivo. ´
Um silêncio quase mórbido no ar, dos dois lados da linha.
Parecia-se com um tiro que atravessou o estômago dos dois, e nenhum podia falar.
Julien quebrou o silêncio desligando o telefone. Não podia expressar a dor que sentia, o sentimento de injustiça que a deixava de mãos atadas, Ele era a última pessoa do mundo que merecia aquilo, para ela, Jimmy era sagrado.

Apenas uma pessoa soube da nova situação de Jimmy antes de Julien: Allan.
Dois dias antes de contar tudo à amiga, Jimmy havia ido ao hospital sozinho, chegou em casa mais cedo, sentou-se no sofá e quis morrer, comparou o exame médico à um atestado de óbito e deu-se por morto. Allan chegou em casa e encontrou o amigo no chão, de olhos inchados, mãos trêmulas. Tirou o envelope de baixo dos braço de Jimmy, que o segurava como se fosse voar a qualquer instante, como se tivesse que apertar ao máximo para ter certeza de que aquilo era real. Enquanto lia os papéis, Jimmy suplicava sua morte, em meio à lágrimas, Allan lhe beijou como o amante oculto que foi por anos, com lábios fracos que resumiam a dor e o medo mas usou um disfarce para o pânico que sentia e sussurrou "não sinto nojo de ti, meu amigo, não estás morto".
Palavras inúteis. Já não queria ouvir nada, saber de nada. Jimmy então tentou dormir mas todas as memórias das vezes que usou drogas, que transou sem saber com quem, onde ou como, estavam piscando como flashes de luz quase cegantes e sentia uma culpa incomparável, um medo, terror. Mas nenhuma memória foi tão perturbadora quanto a da vez em que sofreu abuso ****** em uma das festas. Uma pessoa aleatória e sem grande importância, aproveitou-se do menino pálido e mirrado que estava dormindo no chão, quase desmaiado por culpa de todo o álcool consumido, mas ainda consciente, Jimmy conseguia sentir sua cabeça sendo pressionada contra a poça d'água que estava em baixo de seu corpo, e ouvia risos, e esses mesmos risos estavam rindo dele agora enquanto tentava dormir e rezava pra um deus que não acredita para que tudo fosse um pesadelo.
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Naquele dia, Jimmy, que já era pessimista por si só, prometeu que não se trataria, que iria apenas esperar a morte, uma morte precoce, e que este seria o desfecho perfeito para alguém que envelheceu tão rápido, mas ele não esperaria sentado, iria continuar sua vida de auto-destruição, saindo cedo e voltando tarde, dormindo e comendo mal, não pararia também com nenhum tipo de droga, principalmente cigarro, que era tão importante quanto a caneta ao escrever seus poemas, dizia que sentir a cinza ainda quente caindo no peito o inspirava.
Outra manhã chegou, e mesmo que desejasse com toda força, tudo ainda era real, seus pensamentos eram confusos, dúvidas e incertezas tão insuportáveis que poderiam causar dores físicas e curadas com analgésicos. Trocou o dia pela noite, já não via o sol, não via rostos crús como os que se vê quando estamos à caminho do trabalho, só via os personagens da noite, prostitutas, vendedores de drogas, pessoas que compravam essas drogas, e gente como ele, de coração quebrado, pessoas que perderam amigos (ou não têm), que perderam a si mesmos, que terminaram relacionamentos até então eternos, que já não suportavam a vida medíocre imposta por uma sociedade programada e hipócrita. Continuou indo aos mesmos lugares por semanas, e já não dormia em casa todos os dias, sempre arrumava um espaço na casa de algum amigo ou conhecido, como se doesse encara
D. Furtado
Victor Marques Oct 2013
Vindima que sempre vem

Que regalo é ver estas lindas uvas que serão destinadas a ser pisadas por tantos pés generosos deste povo duriense que nas encostas trabuca com suor no rosto. Depois de tantas canseiras chega a hora da colheita para todos começarem em festa um processo que acabará nos melhores vinhos de Portugal e do mundo.

     Para haver vindima temos de ter videiras bafejadas pelo sol, acolhidas pelo xisto e amadas pelo homem duriense que não se cansa de as amar e bajular. Este meu Douro é sem sombra de dúvida local privilegiado para a produção deste néctar abençoado por Deus.
A videira que Jesus tantas vezes enumerou me faz perceber o universo, a sua diversidade e porque não mesmo a vida depois da morte. Como simples podador o homem corta as vides na esperança de uma boa colheita. Que encanto ver durante seu ciclo o despertar constante de tantos sonhos adormecidos.

      A videira delicia, rejuvenesce, cresce embalada pelo vento em socalcos e patamares e os rios são seus fiéis companheiros e a seu lado tantas árvores dão as azeitonas da paz e serviram de aconchego no Horto das Oliveiras para Jesus Cristo amar os homens e segredar a Deus seu Pai. Temos orgulho em nossos muros de pedreiros que esculpiram seu próprio fado, eles mudaram os olhares de um Douro mal-amado…

Victor Marques
vindima, douro
Victor Marques Oct 2010
O Zé-ninguém da minha escola

Olhos tristes e sempre meigos,
Faltam-te doces beijos.
Hesitante e por vezes calmo,
Sentes o belo salmo.


Rouquidão dum velho pastor,
Teu sorriso encantador.
Resposta por vezes certa,
Galo que te desperta.


Insegurança desmedida,
Rosto facetado pela vida.
Incompreendido nesse mundo teu,
Tens o carinho que Deus te deu.


Tens o nome de António, de José,
Percorres o País de lés-a-lés,
As tuas vitórias são grandes conquistas,
Que não são sociais ou políticas.


Victor Marques
No rosto leproso da noite, ventos giram cartas como quem não quer nada/ Ou talvez vultos guardam melancolia no quarto branco/ Oh! tão bom beber hálito gelado da lua junto aos antepassados, lá se vão fugidios das estrelas; sete são. Os mais jovens, no rio, colhem cristais & dançam ( ritual veludo puro, sombra azul circula)/ Rápido, múltiplas festas ecoam do infinito, este cínico pastor poda asas feridas; mãos sagradas dos mortos & dos mitos/ Bebemos & cantamos, no colo floresta desnuda/ Neste banquete vermelho, virgens dão o toque úmido & todos os santos saboreiam o útero/ Sob o aconchego do delírio a loucura desfila, santa de todos os dias!
Perdido. Tomado pela multidão histérica de memórias. Mutilação. Gritos de agonia. Horror nos olhos de  "inocentes". Memorias de imagens presas numa parede de incapacidade. Incapaz de ver. Incapaz de saber. De ser. Sou o luto de minha tragédia. Ser o algoz do mundo. Já não me lembro.  Ele se diz meu sogro. Minha mulher está morta. As crianças foram brutalmente assassinadas. Seus corpos foram abandonados. Todos fugiram pelo terror do algoz. E eu apaguei. Já não me lembro. É preciso acreditar?  Lembrei que não me lembro do meu rosto. Ele me pediu para olhar ao espelho. Olho diretamente para aquela figura. Então este sou eu.  Apático. Ele sorri. Também tento. Pele azul. Olhos de vidro. Meus braços se misturam com uma membrana de carne. Me estico. É possível voar? Sim! Nós todos podemos voar, este é um planeta muito grande para simplesmente caminharmos. Às vezes ele fala como um mentiroso. Eu o detesto. Meus pés são como minhas mãos, só que maiores. Você deseja cavar os túmulos com seus pés? Esse não é o ponto! A questão é que sou diferente. Que vivo num mundo diferente. Onde eles são como eu. Deixe- me viver a fantasia!
Me levaram para a sala de recuperação de memória. Fizeram um tratamento
intensivo.
Tema: quem é você?
Resultado: Você é Khaladesh! Você é Khaladesh! Você é Khaladesh!(...)
Tome estes remédios!
Não posso!
Tome estes remédios!
Não quero!
Resultado: há uma guerra acontecendo. Um inimigo misterioso destruiu tudo o que importa. Quem é tal inimigo? Uma legião de sadismo. Tudo o que é perverso neste mundo carrega o nome  Arcantsulyan. É preciso sentir ódio por Arcantsulyan! É necessário se proteger contra Arcantsulyan. Oremos aos deuses!  Será que não orei o bastante? Já não me lembro. Livrai-nos de Arcantsulyan!
Há dois Sóis em meu mundo! Há também um deserto. Um jovem caminha em direção à Thaeran'khur. Seus passos cambaleantes e exaustos seguem por dois dias inteiros pelas areias do deserto... Não há noite em Thaeran'khur. Um calor crepitante invade sua alma. Há calor em seus olhos. Há calor em suas mãos. Há calor em seus brônquios. O calor e a poeira espreitam sua angústia. Incidem sem avisar em sua esperança. Um calor tão horrível que faz curvar seu corpo em incomensurável e desesperada agonia. Nada mais importa. Seu lar já foi esquecido. Suas lembranças já são meros devaneios. O que lhe resta é apenas entregar-se para a iminente morte ou seguir caminhando até morrer. À sua frente há uma fronteira que divide a parte inabitável do restante do deserto: um local onde a radiação  dos Sóis transformou toda a extensão de  areia em puro vidro. Um local onde não ha como permanecer vivo. O jovem desesperado e quase inconsciente vê a luz refletida pela gigantesca camada vitrificada. Ele segue em direção à luz. Irá cruzar o limiar da consciência: adentra o deserto de vidro... Incineração fatal... Seu corpo se transforma em areia.  O que aconteceu depois? Ele deixou de ser. Sabe o que isso quer dizer? Quer dizer que já não é. Ele abriu caminho à todas as possibilidades. Seu corpo se fragmentou em pedaços infinitos e se misturou com os infinitos pedaços que ali haviam. Ele se tornou tudo o que existe. Ele é o deserto agora. Mas o deserto está se unificando. A luz está juntando os pedaços. Os grãos estão se tornando vidro. Reflita...
Você é Khaladesh. Membro da rebelião contra Arcantsulyan. Vive escondido nas florestas sobre- oceânicas do Oceano Yuregjorth. Sua mulher e suas crianças foram destroçadas. Você perdeu sua memória. Percebe o quão insano isso tudo parece? Você não está bem. Precisa se lembrar. Não posso me lembrar de nada. Lembre-se de sua família. Lembre-se de seu ódio por Arcantsulyan. Você deve se vingar. Você deve tomar os remédios. Você deve se juntar à rebelião novamente. Você deve se fixar no que é real. Você será espião em território inimigo. Você precisa perceber seus delírios. Você precisa descobrir o que é Arcantsulyan. Você precisa se lembrar quem você é.
Salpicar o teu rosto com farinha, enquanto preparassemos juntos o teu bolo favorito

Dar-te os beijos que me apetecesse, com os olhos, sempre que estivesses distraido a apreciar o "flowering tea", que te desse a escolher

Sentar-me no teu colo e ver-te desenhar

Fazer de ti a manta que me aconchega, entrelaçar os meus dedos nos teus e ver um filme até adormecer

Levar-te o pequeno almoço à cama e acordar-te com um beijo de bom dia.

Ser...
a única a conseguir te arrancar aquele sorriso nos piores momentos...
a bateria desenfreada a bater dentro do teu peito...
a tua melhor amiga...
quem faz valer cada acordar teu.

Que fosses a excepção que acreditei que eras, o porto seguro por quem vale a pena esperar para partilhar a vida.

Por ti... por nós... mudei, ignorei medos e arrisquei...
Não deste valor... desacreditei.
To make a war of white flour with you while we prepare your favourite cake

To kiss you secretly, with my eyes, whenever you would be distracted enjoying the flowering tea of your choice

Sit on your lap and see you drawing

Make you the blanket that cuddles me, entwine my fingers in yours and watch a movie until we fall asleep

To wake you up with a good morning kiss and have breakfast in bed with you

To be the one, to be the only one that makes you smile in the harsh moments, to be the cause of a unrestrained drums that beat inside your chest, to be your best friend, to be the one who makes it worth for you to wake up every day.

I wanted, I believed that you were the exception, the safe harbour for whom it is worth waiting for to share a life.

For you ... for us ... I changed, I ignored my fears and risked it all...
...
Victor Marques Jan 2011
O amor já tem nome

Nas imagens que nós temos virtuais,
Nas pradarias e rochas,
Os amores não são iguais,
Preciso de beijocas.

Estrada que nunca vemos,
Florestas virgens com beleza rara,
Sol que se põe na tua cara,
Poesia e amor que temos.


Teu olhar até consome,
Cabelos batem no rosto,
Sentimento e gosto,
Amor com nome.


O mar com espuma,
Areias te amam,
Corais na bruma,
Anjos te aclamam.

Victor Marques
amor, nome
Sua mãe morreu de câncer, meu filho.
Sua mãe morreu lentamente, sem dramas,
mas com intensa agonia.
Foi o que lhe respondi quando
perguntou o por que eu nunca
terminei de escrever meu
primeiro romance.
Você levou suas mãozinhas pequenas
e disformes
ao meu rosto e tocou meus olhos
com carinho e violência.
Levantei, afastando-me: estava na
hora de sua injeção: hormônios
de crescimento
de homens ainda mais mortos
que eu.
De quem é a imagem que vejo no espelho?
Não é a mesma que me observo sem vê-la
Não possui a fonte existencial que lança os arredores para o interior
A única diferença entre mim e o que me permeia
É o corpo que carrego a todo instante, e dele os diálogos mentais que me definem como uma existência, pois as vozes que me surgem só eu posso ouvi-las e interpretá-las
Mas, talvez, a consciência seja simplesmente um canalizador e não uma fonte, pois as informações vêm de todos os lugares e ao mesmo tempo de um lugar só (ego).
De quem é a imagem que vejo quando olho para outra pessoa?
Não é a mesma imagem que essa outra existência se vê
Essa imagem que vejo faz parte de mim, sou eu, ou talvez o outro que vive em mim, que independe de uma consciência própria que não a minha.
Mas como eu me vejo?
Me vejo como acredito que os outros me vêem?
Eu sou o fruto das experiências passadas
Eu sou inconstante.
Totalmente renascido e irreconhecível a cada experiência
Mas isso é meu ego, o vidro mais frágil
O medo da solidão,
O medo da rejeição,
O ódio que é o medo de amar
O medo de amar que é o ódio por si mesmo
O **** é a carta coringa do desespero
O prazer de calar a dor
Mas o **** também dói, pois é a entrega de seu íntimo para outrem (você se diferencia) nós somos incapazes de amar o que é diferente, o **** fere o ego, pois o auge do prazer se dá com algo que nossa consciência insiste em odiar,
odiamos os outros, odiamos a nós mesmos
Mas é tudo ilusão
Ódio e medo, novamente, caminhando lado a lado
Mas é tudo ilusão
"O que está em cima está em baixo, não há diferença"
O que me define como singular?
Minhas roupas, meu cabelo, meu rosto, minha casa
meu carro, minha família, minha história
Fora isso quem sou?
Onde encontra-se a singularidade da voz que só minha mente escuta?
(Minhas ideias surgem de outras ideias que não são minhas
Eu sou o vazio)
Encontra-se no vazio, onde todos são iguais
Onde uma coisa não se diferencia da outra
Onde só nos resta amar, sem dor
A realidade é simplesmente aquilo em que acredito
Nada mais, nada menos
Pois o que os olhos não vêem o coração não sente
Melhor dizendo:
O que a mente não sente os olhos não vêem!
Depois de todo o devaneio
Me lembro...
Uma mulher, cujo a forma de sorrir,
a forma de morder os lábios,
o jeito com que ela me olha com o canto do olho
é totalmente singular, única
Mas não depende do ego, e nem de experiência
é algo inato, belo, não consigo odiar mesmo sendo diferente
Amor? sim
Mas algo diferente também
a vejo e amo como irmã, como mãe, como amante, como amiga
Amo sua existência como um todo
e não sei explicar
Ela escolheu não ficar comigo,
mas sempre vem a mim
Eu ainda continuo a ama-la, sem dor, nem sofrimento

Outra vez saio de uma discussão comigo mesmo sem respostas!
goldenhair May 2013
O quarto escuro e apenas a luz vinda de fora só me deixavam ver o contorno do seu rosto, mas eu ainda conseguia decifrar seus traços, o gosto molhado da sua boca, a textura do seu cabelo.

Experimentava seus lábios, tão feroz quanto o vento quando toca as flores, fazendo-as exalarem seus perfumes, assim como o seu gosto o fazia em mim.

Desfrutava de todo o tato possível, e pelos seus braços, caminhava uma das mãos, enquanto eles se envolviam e se apaixonavam pelo meu corpo, abraçando-o forte, como um leão agarrando sua presa.
Seus beijos me completavam e me envolviam, tal como a mais fina seda do mais belo vestido cai perfeitamente no mais maravilhoso corpo de mulher. Seu cheiro doce, de pele morena, sufocava toda a hesitação que ainda me restava e me fazia entregar-me por inteiro. Suas mãos teimavam em bagunçar meu cabelo que, envolto em seus dedos, se realizava por encontrar tanta obstinação vinda de um único conjunto de dedos.  

Por um momento, antes de dar-me um outro beijo, me olhou nos olhos, com olhar de pescador que foi fisgado pelo canto da sereia e, de repente, nada mais existia.
Rui Serra Aug 2015
queria pintar nesta tela
que já só por si é bela
o teu rosto a sorrir.

queria fazer rosas no céu
e pintar esse rosto teu
como o de uma rosa a florir.

transformar o teu sofrimento
com uma pincelada de ironia
e transformar o teu amor
na mais pura poesia.
Hoje enquanto dormia, sonhei que num jardim vivia,
Ouvia os pássaros, cantar lindas canções, com ternura,
Sentia-se a água da chuva correr sem sua armadura,
As flores eram verdes, como os sonhos, de pura lixivia!

Lavaram-se as vestes, lavaram-se as mãos, enquanto sonhava
Quando acordei pela manha do costume cheia de sonhos,
Percebi que se tinha tornado uma rotina ser feliz e eu amava,
Amava incansavelmente seus olhos, via o coração aos quadradinhos!

Quadros pintados nas paredes de casa cheio de nossas recordações,
Hoje, era senão mais um dia, onde pintava na tela nossas emoções,
Aquilo que começou num passeio descalço junto da lagoa vazia,
Formava agora na parede de casa retractos de uma família que crescia!

Peguei depois na espátula da minha vida, peguei-a de nova na mão,
Olhei-a nos olhos, senti-lhe as formas e apertei-a ali junto ao coração,
Em tempos atrás deixei-te fugir, deixei-te viver e crescer longe de mim,
Mas hoje, e agora, para sempre, te quero ter aqui, até aquilo que é o fim!

Quando à noite me for deitar, só quero acordar para te olhar o rosto,
Porque os sonhos, por mais belos e lindos, mesmo de nos encantar,
Não se comparam sequer a tudo aquilo que tu na vida me fazes amar!

Autor: António Benigno
Código de autor: 2013.08.29.02.17
O desenho inscrito sobe a forma de sinais,
Que percorrem o mapa secreto desse corpo,
Onde no olhar se vêm certezas divinais,
Mais secreto é saber que alimentas o meu horto!

O dilema repleto de infindáveis caminhos,
Onde a escuridão que existira se esfumou,
Nossos dizeres tornam-se atos e miminhos,
Essas dúvidas são claras e o tempo levou!

Como tu eu sinto que o melhor é mesmo acreditar,
Soltar-me no vento e explorar o sentimento quente,
Que chegou recheado de sonhos e contornos de cativar,
É porém o desenho do teu rosto que guardo tão presente!

Presente tão bom, presente que Deus me enviou no caminho,
Posso mesmo confiar que tenho vontade de ir pela avenida,
Nem tão pouco, nem tão perto a luz do fundo eu imagino,
Mas o alimento que trouxeste e que a ti vai deixando com vida!

Segue nas minhas veias na esperança de te poder hoje e sempre olhar,
Apertar-te nos braços e encontrar o meu, em tempos já distante Norte,
E hoje aperto em minha mão a bússola que me trouxeste em passaporte,
Para o vão da felicidade, de que hoje quero acreditar, e comigo, a ti levar!

Autor: António Benigno
Para ti Lili…
Julia Jaros Nov 2016
Corroeu as paredes da garganta
Ficou sem fala pra dizer "eu te amo"
Sozinha bêbada na varanda
Temendo pela falência de seu âmago.

O líquido toca sua boca
Atinge seu organismo com um açoite
Convidativo, vivo
Não exigia nada mais aquela noite.

Não sentia mais seu fígado
Assim como seu coração
Bebida quente que um dia a enlouquecia
Hoje lhe extingue a solidão.

Se seu rosto é a garrafa, ela quebra na parede
Se seu gozo é a bebida, prefere viver com sede
Se o sol é a sua presença, só sai a luz do luar.
Se rajska quente é a sua ausência, ali vai se afogar.
Victor Marques Dec 2009
Caminhos sentidos de vivência,
Olhar meigo de criança,
Sentir só o presente, o sol que aquece,
Dia novo que sempre se esquece.

Rosto da vida, do amor, do momento.
Planície que se estende no horizonte,
Penedo se ergue no cimo do monte,
Legado do ser, do pensamento.

Sentir o calor com os lábios semi-abertos,
Procura de carinhos e afectos,
Ternura tua com eterna leveza,
Arco-íris cobre-me com tua pureza.

27 De Novembro de 2008

Grande abraço.


Victor Marques
- From Network, wine and people....
Dayanne Mendes Dec 2013
Eu te olhei
Pela primeira vez na chuva,
Seu sorriso brilhava
As lágrimas no meu rosto pararam
E eu sorri também.
Queria sentir seu perfume,
Todo dia.
E quando eu te disse adeus,
Tudo em mim doía.
E dói,
Dói até hoje.
Eu não consigo evitar,
Ao me olhar no espelho,
Tudo que vejo é você.
É vento ou chuva, ou pequeno contratempo,
Vêm o sol e brilha o céu, de me ouvir falar,
As chamas se apagaram, num contratempo,
A vontade de ver brilhar há, e não vai acabar!

Os dias cinzentos não fizeram algum sentido,
As pessoas pelos tempos afirmam vontades,
Eu pinto o quadro de sangues e lealdades,
Aqueceu-se o dia e para nós, céu bandido!

Leva-nos as queridas saudades, sente o carinho,
Destes seres de alma vadia e despreocupados,
Nossas mentes não são seres assim, calçados,
Têm asas que voam, esse é o nosso caminho!

As angustias e tristezas, são certezas de alegria,
Percebe-se e sente-se que momento, é fantasia,
Aguas que passam, desentopem nossa artéria,
A matéria-prima, decide por ficar doce e sadia!

Sai-lhe das cores, nodoas incolores, não existiram,
Sente-se na camisa estampada do soor do teu amaço,
Mancha uniforme, redonda, penetrante que a queiram,
Corações em sopros sufocantes, que deram este laço!

Transpirações, pelo encontro de meus sonhos antigos,
Vi-te de longe e apreciei tão de perto, a cor desse rosto!

Autor: António Benigno
Código de autor: 2013.04.24.02.09
Letícia Costa Jun 2013
A planta que se seguia
Enquanto pelo corredor eu andava
Rosto caído de sono
E a virada de olho enquanto o outro não olhava

A blusa gigante
O café
A música alta
E os pensamentos torturantes

Os passos vêm e vão
O olho vidrado na porta
O sinal toca
E tudo vira pó
goldenhair Jun 2013
queria ter congelado a imagem do seu sorriso
queria ter gravado o som da sua voz
naquela tarde de domingo você esmagava meu peito
com suas canções no violão, seu olhar de garoto sabidão
cantava, me encantava.

o vento batia e bagunçava os cachos do seu cabelo
o sol penetrava por entre seus cílios e
seus olhos ficavam mais claros do que já são.  
cada vez que sentia seu cheiro era como
um desfrute do paraíso.
criava um romance com as pintas do seu rosto
e escrevia cartas de amor pra elas.

queria ter congelado aquela imagem, você descalço
queria poder sentir novamente a textura da sua pele,
branca e sardenta sendo queimada pelo sol
queria poder roubar as curvas do seu sorriso
imagina...as linhas da sua mão, as linhas da minha mão
se entrelaçando, nos casando.
Victor Marques Mar 2013
Videira Madura

Videira que a seca não abalou,
Coração meu que por ela chorou,
Bagos verdes com odores,
Videira e seus amores…

Videira embriagada no terreno duriense,
Sol quente que te bate no rosto,
Vento leve do mês de Agosto,
Xisto o teu confidente.

Videira sem repouso que merece,
A uva madura também apodrece,
Ressuscita, ao seu podador dá carinho,
Videira madura, o melhor vinho.

Victor Marques
dead0phelia Oct 2022
se chegar perto demais pode ser que você veja a cicatriz no meu rosto de quando eu era pequena e gostava de pular em cacos de vidro porque achava tão bonito ver o brilho dos caquinhos verdes contra a luz do sol
se chegar perto demais pode ser que você veja a pintinha que tenho no meu rosto e que odeio porque é a mesma da minha mãe e eu não gosto de ter nada dela em mim
pode ser que veja uma menininha sentada no canto da sala lendo um livro sozinha e fingindo não se importar com os gritos que derrubavam as paredes
se chegar muito perto pode achar a adolescente que transava com os caras mais velhos da escola na tentativa de realocar os proprios caquinhos com sangue
se chegar muito perto pode ser que descubra que ja pensei um milhão de vezes em envenenar um monte de gente que me fez mal
se chegar perto assim pertinho vai ver que é tudo encenação
e que na maioria das vezes
calculo tudo o que eu to fazendo
como se eu tivesse um roteiro o tempo todo em mãos
e quando eu danço de olhos fechados é porque eu tô me observando de fora e ditando o ritmo dos meus próprios pés
se chegar muito perto pode ser que veja
que eu não sou de verdade
que nem sequer existo
se chegar muito perto vai ver
dentro dos meus olhos preso na retina
o terror que eu tenho de ser descoberta
e por isso
mantenho distância
Igor Vitorino Jan 2015
Cadê o meu pedaço de bolo?
Não me faça de tolo
Meu coração queima como fogo
Eu não desistirei sem diálogo
Não me vire às costas e nem rosto
Eu sei que fui puro desgosto
Que fui canalha, safado e traste
Que transformei sua vida num desgaste
Não mereço nenhuma consideração
Nem um pouco de sua admiração
Sei que a minha presença nesta festa
Não vai conseguir nenhuma fresta
Nesse coração que tanto machuquei
Eu que por muito tempo lágrimas chorei
Arrependido por tê-la  abandonado
Dai esse pedaço de bolo
Que para mim será apenas um consolo
De tê-la imensamente magoado
Será o pagamento de um amor não devotado
Meu grande pedido de perdão
Meu ingresso para a solidão!
Solidão
Expo 86' Oct 2015
Seu rosto já não é mais o mapa que me guia
Seu sorriso já não representam as estrelas que me fascinam
E as morfina de suas palavras estão longe de ser efetivas
Mas o que fazer?
Sempre soube que meu sim foi carregado de insensatez
E mais uma vez tenho que pensar
Em qual moeda essas fantasias devo pagar
Angustia que pode virar combustível
Ou talvez, raiva que será nosso castigo

Talvez apenas devo esquecer isso
Mas o pensamento de puxar o gatilho
É muito mais forte do que o de sofrer sozinho
E você não sabe como é difícil
Saber que essa noite estarei sozinho
E a falta que sinto dos seus carinhos

Mas agora tudo isso é passado
E apenas agora consigo enxergar
O que onde existia um começo
Coexistia um erro
E o que achávamos que seria amor
Apenas era a euforia de um perdedor que ocupa o segundo lugar no pódio do amor
Filomena Dec 2023
Está frio o tempo
E está forte o vento
Mas o rosto está contento
Que não falta aquecimento

Porque na figura
No caminho pela rua
As botinhas são felpudas
Refletindo as doçuras

E maldosamente olha
As pessoas na recolha
Mas ela nunca está nervosa
E sempre porta-se garbosa

E a sua processão
Nessa grande multidão
Não precisa de permissão
E é doce a sua canção

Porque o amor e o amizade
Para ela são bastantes
E não há necessidade
Atentar ao desplante

E está frio o tempo
E está forte o vento
Mas o rosto está contento
Que não falta aquecimento
My first attempt at writing in Brazilian Portuguese.
If you speak Portuguese
and have a suggestion,
please let me know.
Original English:
https://hellopoetry.com/poem/4594310/the-fuzzy-boots/
Dayanne Mendes Feb 2013
O vento sopra meu rosto,
E eu me pego em devaneios.
Sonhando com amores improváveis,
Não querendo amores resistentes.

Não sei a que se deve o fato,
De meu coração gelado,
Preferir o inacessível,
E descartar o mais favorável.

Não sei se é o passado,
Que me persegue,
Ou o presente,
Que há tempos, está mudado.

Mas ainda não esqueço, aqueles lindos olhos claros.
Wörziech Nov 2014
Brisa leve e doce em meu rosto
parte de um universo nunca tocado
reflexos de um sol recôndito apenas visto e apreciado.

Perfeição é viajar naquele universo.

Alucinação.

Um devaneio me faz recordar dos caminhos felizes
que eu jamais percorri.

Ilusão autora.
Ilusão aniquiladora.

Sim, o universo se foi.
Está morto.
Juliet R Jun 2014
Bebe os  segredos proibídos dos meus lábios
Como se de uma confissão se tratasse
Arruína-me esta vontade inquieta
Destrói-me este desejo de ser livre
E concretiza a vontade de pertencer
Perdoa-me qualquer avanço suave e brusco
Não tenciono deixar-te ir no sentido contrário
Sorri cada vez que este vermelho surge no meu rosto
É a consequência deste sentimento que me provocas
Tu fazes para me relembrar quão bom é ter-te aqui
Porque apesar de os sonhos que me inquetam durante a noite
Serem os mais puros desejos concretizados fantasiosamente
Não passam disso, fantasias inconcretizadas
Há espera de serem materializadas
Exigo levemente mas afintadamente que não partirás sem mim
Ajuda esta mente inquieta a suavizar estes incontrolos
Completamente ansiosos cansados de ansiar por mais
Incontrolos inteiramente controlados pelo consciente
Com o inconsciente gritando para se descontrolarem
In portuguese. Inspiration of the day.
Estou sendo impelido a atravessar esta entrada, meu corpo permaneceu imóvel até este exato momento, quis correr para longe, quis me esconder, quis deixar de existir, mas esta porta está escancarada diante o meu ser despido, não posso ver absolutamente nada para além da porta, mas sei que algo me observa, meus devaneios consomem novamente meus pensamentos,  algo terrível me espera do outro lado. Assaltantes? Sequestradores? Estupradores? Maníacos? Lunáticos? Pervertidos? Psicopatas? Minha mente está se descolando da realidade, sinto meus hormônios de horror dissipando meu pensamento lógico... Estou diante o Demônio! O ônibus vai me levar ao inferno! Sou culpado! O que eu fiz foi horrível! ............O que você fez foi maravilhoso!............ Esta voz atravessa a escuridão, entra pelos meus ouvidos  e explode nas profundezas da minha inconsciência.

Entre no ônibus!...........Estou obedecendo sem sequer perceper, minhas pernas estão se movendo com tremor e dificuldade, subo o primeiro degrau, o segundo, nesta penumbra acho que posso ver o motorista, um homem velho e franzino, barba mal feita, branca, pele suja, roupas velhas, antigas. Voc.. Vá para seu assento! Não me deixou falar, tudo bem! Cadê um assento livre? Ali!  Parece que todos os outros estão lotados. Todos aqui são feios, sujos e maltrapilhos, estão exatamente como eu! Tem uma velha sentada no banco ao lado do meu. Todos estão me encarando, ela está me encarando. Como suas expressões são severas! Ela está forçando um sorriso, seus dentes são muito podres... Então...cofff...cooffff...cooooooooofff... Gotículas de saliva da tosse da velha estão escorrendo pelo meu rosto, o bafo dela lembra carne morta, em decomposição, quase tenho vontade de vomitar, ela está aproximando mais ainda  seu rosto ao meu... Então, você também está indo para lá? Eu não sei! Não sabe?!! Então você não deveria estar aqui!!! Todos estão me encarando, seus olhos expelem puro ódio!...........Você vai descer aqui!!!

Está entrando pelas minhas veias, guiando intuitivamente meus movimentos, enquanto meu eu se afoga num oceano tempestuoso. Toma minha voz, fala por mim... Como OUSA se dirigir A MIM, sua VELHA IMUNDA? Se olhar pra mim mais uma vez vou ARRANCAR todos os seus dentes podres!

Eu dei um chute na cara da velha! Eu dei um chute numa velhinha doente! O que foi que eu fiz? Ela está ali caída no assoalho do ônibus, está gemendo muito! Tem sangue escorrendo pelo seu nariz! Meu Deus, o que foi que eu fiz?  Ela está tendo convulsões?? Meu Deus, meu deus! Hahahahahahaha hahahahahahaha hahahahahahaha ahahaha hahahahahahaha hahahahahahaha... Que porra é essa? Puta que pariu! A velha está rindo??? Está freneticamente dando gargalhadas grotescas. Ninguém mais está olhando para mim. Não sei o que pensar! A velha... Está me encarando... sorrindo com crueldade. Parece que ela está tentando me falar alguma coisa...

...........Então você realmente está indo para lá!
Expo 86' Jul 2016
Sabe, quando te avistei naquela ensolarada tarde de junho, fiquei totalmente perplexo, a maneira que seus longos cabelos caiam nos seus ombros, como as sardas no seu rosto formavam a mais bela constelação, ou a maneira que você falava sobre a poluição e como o aquecimento global iria acabar com o mundo.

Eu nunca fui uma pessoa muito idealizadora, ou que tinha sonhos grandes, sempre me contentei com pouco ou quase nada, sempre fiquei feliz em ficar no banco de reservas. Mas no momento em que suas palavras tão entusiasmadas e caóticas entraram no meu cérebro e o atingiram como o mais brutal acidente automobilístico da historia, eu pensei: Eu quero salvar a todos, eu quero ser um astronauta e colonizar o espaço, descobrir novas coisas além do espaço entre a minha cama e o interruptor do quarto.

Aquela sensação maravilhosa durou apenas alguns segundos, e logo, a maldita insegurança voltou, me sentia humano novamente, e dessa vez tinha muito mais medo, tinha medo que não salvaria a ninguém, que não conseguiria fazer nada.
Fechei os olhos, e em um misto de angustia e medo pensei: Mesmo que eu não salve a todos, eu ficaria feliz em apenas te salvar, porque acho que te amo, sabe?
Matthieu Martin Jul 2015
A chuva cai, o corpo esfria.
A neblina sobe ao cair do dia
O vento nos carrega, sem norte
a vida nos entrega à nossa própria sorte.

Sozinhos no mar,
Meu rosto disforme encontrou o seu
O enigma daquele olhar entreaberto como uma porta
fumei um pouco do amarelo, bebi um gole de azul

Minha mente anoiteceu verde de alegria e
meus olhos vermelhos como a lua cheia
daquele dia

O sol fugiu pra um céu estrelado
deixou você  ao meu lado
e quando voltou nos encontrou
dançando na chuva
Rui Serra Mar 2014
Era noite.
Na escuridão, cintilavam pequenas estrelas.
Abriam-se e fechavam-se os olhos castanhos
daquele rosto alegre.
Ouviu-se, no meio daquela noite quente, o miar de
um gato perdido! no momento, caíra em cima da
minha cama uma violeta, tal qual os olhos, aqueles
olhos sensuais que me prendiam!
Fui convidado a amar...
Perdi o senso do lugar,
o senso do momento e perdi-me na noite...
E amei!...
Amei aqueles lindos olhos pestanudos, aquela boca
de lábios quentes, aquele corpo suave, excitante e
carente!
E pensava em não acordar; não queria perder
aquela paixão, nem imaginar que estava a sonhar.
Aquilo não era um sonho, nem tão pouco fantasia!
Finalmente descobri e gritei de alegria!
É a pura realidade.
Voltando-me para o outro lado, agarrei na almofada
e adormeci,
a pensar
em
ti.
Mariana Seabra Jul 2023
Chegaste a mim em forma de argila, num balde de plástico furado.  
Apanhei-te, de surpresa, embrulhada nas ondas do meu mar salgado.  
Estavas escondida, por entre os rochedos, rodeada pelas habituais muralhas que te aconchegam,  
                                                   ­     as mesmas que me atormentam,  
quando levantas uma barreira que me impede de chegar a ti.  

Segurei-te nos braços, como quem se prepara para te embalar. Sacudi-te as algas, e encostei o meu ouvido à casca que te acolhia no seu ventre.  
Não conseguia decifrar o som que escutava, muito menos controlar a vontade de o querer escutar mais. Algo ecoava num tom quase inaudível. Sentia uma vida...uma vida fraca, sim...mas, havia vida a pulsar. Podia jurar que conseguia sentir-te, para lá da barreira, como se me tivesses atravessado corpo adentro.
Ainda não conhecia o som da tua voz, e ela já me fazia sonhar.  

Pulsavas numa frequência tão semelhante à minha!... não resisti,  
fui impelida a chegar mais perto. Precisava de te tocar, precisava de te ver,
     só para ter a certeza se eras real,
                           ou se, finalmente, tinha terminado de enlouquecer.

Se tinha perdido os meus resquícios de sanidade,  
                                                     ­                                   consciência,
                                                                ­                        lucidez,                              
ou se era verdade que estávamos ambas a vibrar,
no mesmo espaço, ao mesmo tempo, no mesmo ritmo de frequência, uma e outra e outra...e outra vez.  

Vieste dar à costa na minha pequena ilha encantada. Na ilha onde, de livre vontade, me isolava.  
Na ilha onde me permitia correr desafogadamente,  

                                             ­                            ser besta e/ou humana,  
                                                       ­                  ser eu,  
                                                           ­              ser tudo,
                                                                ­         ser todos,  
                                                        ­                 ou ser nada.  

Na mesma ilha onde só eu decidia, quem ou o que é que entrava. Não sabia se estava feliz ou assustada! Mais tarde, interiorizei que ambos podem coexistir. Por agora, sigo em elipses temporais. Longos anos que tentei suprimir num poema, na esperança que ele coubesse dentro de ti.

(…)

“Como é que não dei pela tua entrada? Ou fui eu que te escondi aqui? Será que te escondi tão bem, que até te consegui esconder de mim? És uma estranha oferenda que o mar me trouxe? Ou és só uma refugiada que ficou encalhada? Devo ficar contigo? Ou devolver-te às correntes? Como é que não dei pela tua entrada...? Que brecha é que descobriste em mim? Como é que conseguiste chegar onde ninguém chegou? Como é que te vou tirar daqui?”.  

Não precisei de te abrir para ver o que tinha encontrado, mas queria tanto descobrir uma brecha para te invadir! Não sabia de onde vinha esse louco chamamento. Sei que o sentia invadir-me a mim. Como se, de repente, chegar ao núcleo que te continha fosse cada vez menos uma vontade e, cada vez mais uma necessidade.

Cheiravas-me a terra molhada,  
                                                      ­   depois de uma chuva desgraçada. Queria entrar em ti! Mesmo depois de me terem dito que a curiosidade matava. Queria tanto entrar em ti! Ser enterrada em ti!  

A arquiteta que desenhou aquele balde estava mesmo empenhada                                                        ­                                                             
                                 em manter-te lá dentro,  
e manter tudo o resto cá fora. A tampa parecia bem selada.  

Admirei-a pela inteligência. Pelo simples que tornou complexo.  
Pela correta noção de que, nem toda a gente merece ter o teu acesso.

(...)

Vinhas em forma de argila...e, retiradas as algas da frente, vi um labirinto para onde implorei ser sugada. Estava no epicentro de uma tempestade que ainda se estava a formar e, já se faziam previsões que ia ser violenta. O caos de uma relação! de uma conexão, onde o eu, o tu e o nós, onde o passado, o futuro e o presente, entram em conflito, até cada um descobrir onde se encaixa, até se sentirem confortáveis no seu devido lugar.  

Estava tão habituada a estar sozinha e isolada, apenas acompanhada pelo som da água, dos animais ou do vento, que não sabia identificar se estava triste ou contente. Não sabia como me sentir com a tua inesperada chegada. Não sabia o que era ouvir outro batimento cardíaco dentro da minha própria mente,  

e sentir uma pulsação ligada à minha, mesmo quando o teu coração está distante ou ausente.  

No começo, espreitava-te pelos buracos do balde, por onde pequenos feixes de luz entravam e, incandesciam a tua câmera obscura,  

                 e tu corrias para te esconder!
                 e eu corria para te apanhar!
                 e foi um esconde-esconde que durou-durou...
                 e nenhuma de nós chegou a ganhar.  

Quanto mais te estudava, menos de mim percebia. Mais admiração sentia por aquela pedra de argila tão fria. "Que presente é este que naufragou no meu mar? Como é que te vou abrir sem te partir?"

Retirei-te a tampa a medo,  
                                                a medo que o teu interior explodisse.  

E tu mal te mexeste.  
                                  E eu mexia-te,
                                                           remex­ia-te,
                                                           virava-te do direito e do avesso.  

És única! Fazias-me lembrar de tudo,
                                                          e não me fazias lembrar de nada.

És única! E o que eu adorava  
é que não me fazias lembrar de ninguém,  
                             ninguém que eu tivesse conhecido ou imaginado.

És única! A musa que me inspirou com a sua existência.  

“Como é que uma pedra tão fria pode causar-me esta sensação tão grande de ardência?”

(…)

Mesmo que fechasse os olhos, a inutilidade de os manter assim era evidente.  
Entravas-me pelos sentidos que menos esperava. Foi contigo que aprendi que há mais que cinco! E, que todos podem ser estimulados. E, que podem ser criados mais! Existem milhares de canais por onde consegues entrar em mim.  

A curiosidade que aquele teu cheiro me despertava era imensa,                                                          ­                                                

               ­                                                                 ­                  intensa,
                                                                ­                                                       
         ­                                                                 ­                         então,  
                                          
             ­                                                                 ­                    abri-te.

Abri-me ao meio,  
só para ver em quantas peças é que um ser humano pode ser desmontado.

Despi-te a alma com olhares curiosos. E, de cada vez que te olhava, tinha de controlar o tempo! Tinha de me desviar! Tinha medo que me apanhasses a despir-te com o olhar. Ou pior!  
Tinha medo que fosses tu a despir-me. Nunca tinha estado assim tão nua com alguém.  
Tinha medo do que os teus olhos poderiam ver. Não sabia se ficarias, mesmo depois de me conhecer. Depois de me tirares as algas da frente, e veres que não sou só luz, que luz é apenas a essência em que me prefiro converter. Que vim da escuridão, embrulhada nas ondas de um mar escuro e tenebroso, e é contra os monstros que habitam essas correntes que me debato todos os dias, porque sei que não os posso deixar tomar as rédeas do meu frágil navio.  

(...)

Vinhas em inúmeros pedaços rochosos,
                                                                ­             uns afiados,  
  
                                                   ­                          uns macios,

                                                               ­           todos partidos...

Sentia a tua dureza contra a moleza da minha pele ardente,  
E eu ardia.  
                    E tu não ardias,  
                                                 parecias morta de tão fria.  

Estavas tão endurecida pela vida, que nem tremias.  
Não importava o quanto te amasse,  
                                                       ­          que te atirasse à parede, 
                                                        ­         que te gritasse                                                         ­                                                                 ­                    
                                                                ­                            ou abanasse...

Não importava. Não tremias.  

Haviam demasiadas questões que me assombravam. Diria que, sou uma pessoa com tendência natural para se questionar. Não é motivo de alarme, é o formato normal do meu cérebro funcionar. Ele pega numa coisa e começa a rodá-la em várias direções, para que eu a possa ver de vários ângulos, seja em duas, três, quatro ou cinco dimensões.  

"Porque é que não reagias?"  
"Devia ter pousado o balde?"  
"Devia ter recuado?"
"Devia ter desviado o olhar,
                                                      em vez de te ter encarado?"  

Mas, não. Não conseguia. Existia algo! Algo maior que me puxava para os teus pedaços.  
Algo que me fervia por dentro, uma tal de "forte energia", que não se permitia ser domada ou contrariada. Algo neles que me atraía, na exata medida em que me repelia.

Olhava-te, observava-te,  
                                                absorvia-te...
e via além do que os outros viam.
Declarava a mim mesma, com toda a certeza, que te reconhecia.
Quem sabe, de uma outra vida.
Eras-me mais familiar à alma do que a minha própria família.  
Apesar de que me entristeça escrever isto.  

Eram tantas as mazelas que trazias...Reconhecia algumas delas nas minhas. Nem sabia por onde te pegar.
Nem sabia como manter os teus pedaços juntos. Nem sabia a forma certa de te amar.
Estava disposta a aprender,  
                                                   se estivesses disposta a ensinar.  

(…)

Descobri com a nossa convivência, que violência era o que bem conhecias,                                                       ­                                                         
                    então, claro que já não tremias!  
Um ser humano quebrado, eventualmente, habitua-se a esse estado. Até o amor lhe começa a saber a amargo.  

Só precisei de te observar de perto.  
Só precisei de te quebrar com afeto.

Culpei-me por ser tão bruta e desastrada, esqueci-me que o amor também vem com espinhos disfarçados. Devia ter percebido pelo teu olhar cheio e vazio, pelo reflexo meu que nele espelhava, que a semelhança é demasiada para ser ignorada.

Somos semelhantes.  

Tão diferentes! que somos semelhantes.  

Duas almas velhas e cansadas. Duas crianças ingénuas e magoadas. Duas pessoas demasiado habituadas à solidão.  

Só precisei de escavar através do teu lado racional.
Cegamente, mergulhei bem fundo, onde já nem a luz batia,

                                                               ­    e naveguei sem rumo certo  

nas marés turbulentas do teu emocional. E, algures dentro de ti,  
encontrei um portal que me levou a um outro mundo...

Um mundo onde eu nem sabia que uma outra versão de mim existia,                                                         ­                                                         
       ­       onde me escondias e cobrias com a lua.

Um mundo onde eu estava em casa, e nem casa existia,  
                                                      ­            
                       onde me deitava ao teu lado,                                          
                          onde te deitavas ao meu lado,                                                            ­                                            
                    ­            totalmente nua,
      debaixo da armadura que, finalmente, parecia ter caído.  

Creio que mergulhei fundo demais...  
Ultrapassei os limites terrestres,
                                 e fui embater contigo em terrenos espirituais.  

Cheguei a ti com muita paciência e ternura.
Tornei-me energia pura! Um ser omnipresente. Tinha uma vida no mundo físico e, uma dupla, que vivia contigo através da música, da escrita, da literatura…Tornei-me minha e tua!  
Eu sabia...
Há muito amor escondido atrás dessa falsa amargura.  
Então, parei de usar a força e, mudei de abordagem,  
para uma mais sossegada,
                                               uma que te deixasse mais vulnerável,                                                                    ­                                            
         em vez de assustada.  

(…)

“Minha pedra de argila, acho que estou a projetar. Estou mais assustada que tu! Estar perto de ti faz-me tremer, não me consigo controlar. Quero estar perto! Só quero estar perto! Mesmo que não me segure de pé. Mesmo que tenhas de me relembrar de respirar. Mesmo que me custem a sair as palavras, quando são atropeladas pela carrada de sentimentos que vieste despertar…”

És um livro aberto, com páginas escritas a tinta mágica.
A cada página que o fogo revelava, havia uma página seguinte que vinha arrancada. Mais um capítulo que ficava por ler. Outra incógnita sobre ti que me deixavas a matutar.

Soubeste como me despertar a curiosidade,
como a manter,
como me atiçar,
como me deixar viciada em ti,
como me estabilizar ou desestabilizar.  

E nem precisas de fazer nada! a tua mera existência abana a corda alta onde me tento equilibrar.

Segurei-te com todo o carinho! E, foi sempre assim que quis segurar-te.

Como quem procura
                                       amar-te.

Talvez transformar-te,  
                                        em algo meu,
                                        em algo teu,
                                                                ­ em algo mais,
                                                                ­                          em algo nosso.  

Oferecias resistência, e eu não entendia.  
A ausência de entendimento entorpecia-me o pensamento, e eu insistia...Não conseguia respeitar-te. Só queria amar-te!

Cada obstáculo que aparecia era só mais uma prova para superar,  
                    ou, pelo menos, era disso que me convencia.
Menos metros que tinha de fazer nesta maratona exaustiva!
onde a única meta consistia  
                                                   em chegar a ti.
Desse por onde desse, tivesse de suar lágrimas ou chorar sangue!

(...)

Olhava-te a transbordar de sentimentos! mal me conseguia conter! mal conseguia formar uma frase! mal conseguia esconder que o que tremia por fora, nem se comparava ao que tremia por dentro!
Afinal, era o meu interior que estava prestes a explodir.

"Como é que não te conseguiste aperceber?”

A tua boca dizia uma coisa que, rapidamente, os teus olhos vinham contrariar. "Voa, sê livre”. Era o que a tua boca pregava em mim, parecia uma cruz que eu estava destinada a carregar. Mas, quando eu voava, ficava o meu mar salgado marcado no teu olhar.  
Não quero estar onde não estás! Não quero voar! quero deitar-me ao teu lado! quero não ter de sair de lá! e só quero voar ao teu lado quando nos cansarmos de viajar no mundo de cá.  

“Porque é que fazemos o oposto daquilo que queremos? Porque é que é mais difícil pedir a alguém para ficar? Quando é que a necessidade do outro começou a parecer uma humilhação? Quando é que o mundo mudou tanto, que o mais normal é demonstrar desapego, em vez daquela saudável obsessão? Tanta questão! Também gostava que o meu cérebro se conseguisse calar. Também me esgoto a mim mesma de tanto pensar.”

(...)

O amor bateu em ti e fez ricochete,  
                                                    ­                acertou em mim,  
quase nos conseguiu despedaçar.  

Até hoje, és uma bala de argila, perdida no fluxo das minhas veias incandescentes. O impacto não me matou, e o buraco já quase sarou com a minha própria carne à tua volta. Enquanto for viva, vou carregar-te para onde quer que vá. Enquanto for viva, és carne da minha própria carne, és uma ferida aberta que me recuso a fechar.
Quero costurar-me a ti! para que não haja possibilidade de nos voltarmos a separar.

Não sei se te cheguei a ensinar alguma coisa, mas ansiava que, talvez, o amor te pudesse ensinar.  

Oferecias resistência, e eu não entendia.  
Então, eu insistia...
                                   Dobrava-te e desdobrava-me.
Fazia origami da minha própria cabeça  
                                                e das folhas soltas que me presenteavas,
escritas com os teus pensamentos mais confusos. Pequenos pedaços de ti!  
Estava em busca de soluções para problemas que nem existiam.  

"Como é que vou tornar esta pedra áspera, numa pedra mais macia? Como é que chego ao núcleo desta pedra de argila? Ao sítio onde palpita o seu pequeno grande coração?
Querias que explorasse os teus limites,  
                                                      ­      ou que fingisse que não os via?”

Querias ser pedra de gelo,  
                                                  e eu, em chamas,  
queria mostrar-te que podias ser pedra vulcânica.

(...)

Estudei as tuas ligações químicas, cada partícula que te constituía.
Como se misturavam umas com as outras para criar  

                 a mais bela sinestesia

que os meus olhos tiveram o prazer de vivenciar.


Tornaste-te o meu desafio mais complicado.  
“O que raio é suposto eu fazer com tantos bocados afiados?”.  
Sinto-os espalhados no meu peito, no sítio onde a tua cabeça deveria encaixar, e não há cirurgia que me possa salvar. Não sei a que médico ir.  Não sei a quem me posso queixar.
São balas fantasma, iguais às dores que sinto quando não estás.  
A dor aguda e congruente que me atormenta quando estás ausente.
Como se me faltasse um pedaço essencial, que torna a minha vida dormente.

Perdoa-me, por nunca ter chegado a entender que uso lhes deveria dar.  

(...)

Reparei, por belo acaso! no teu comportamento delicado  
quando te misturavas com a água salgada, que escorria do meu olhar esverdeado,
                                  quando te abraçava,  
                                  quando te escrevia,  
                          em dias de alegria e/ou agonia.
Como ficavas mais macia, maleável e reagias eletricamente.  
Expandias-te,  
                          tornav­as-te numa outra coisa,  
                                                        ­              um novo eu que emergia,  

ainda que pouco coerente.  


Peguei-te com cuidado. Senti-te gélida, mas tranquila...
"Minha bela pedra de argila..."
Soube logo que te pertencia,  
                                                    ­   soube logo que me pertencias.  
Que o destino, finalmente, tinha chegado.
E soube-o, mesmo quando nem tu o sabias.

A estrada até ti é longa, prefiro não aceitar desvios.  
É íngreme o caminho, e raramente é iluminado...
muito pelo contrário, escolheste construir um caminho escuro,  
cheio de perigos e obstáculos,  
                                                   ­      um caminho duro,  
feito propositadamente para que ninguém chegue a ti...
Então, claro que, às vezes, me perco. Às vezes, também não tenho forças para caminhar. E se demoro, perdoa-me! Tenho de encontrar a mim mesma, antes de te ir procurar.  

No fim da longa estrada, que mais parece um labirinto perfeitamente desenhado,
                                      sem qualquer porta de saída ou de entrada,
estás tu, lá sentada, atrás da tua muralha impenetrável, a desejar ser entendida e amada, e simultaneamente, a desejar nunca ser encontrada.  

“Como é que aquilo que eu mais procuro é, simultaneamente, aquilo com que tenho mais medo de me deparar?”

Que ninguém venha quebrar a tua solidão!  
Estás destinada a estar sozinha! É isso que dizes a ti mesma?
Ora, pois, sei bem o que é carregar a solidão às costas,  
a beleza e a tranquilidade de estar sozinha.

Não vim para a quebrar,  
                                   vim para misturar a tua solidão com a minha.

Moldei-te,  
                     e moldei-me a ti.

Passei os dedos pelas fissuras. Senti todas as cicatrizes e, beijei-te as ranhuras por onde escapavam alguns dos teus bocados. Tentei uni-los num abraço.
Eu sabia...
Como se isto fosse um conto de fadas…
Como se um beijo pudesse acordar…
Como se uma chávena partida pudesse voltar atrás no tempo,  
                                                        ­      
                                                         segundo­s antes de se estilhaçar.  

O tempo recusa-se a andar para trás.
Então, tive de pensar numa outra solução.
Não te podia deixar ali, abandonada, partida no chão.

Todo o cuidado! E mesmo assim foi pouco.  
Desmoronaste.  
Foi mesmo à frente dos meus olhos que desmoronaste.  

Tive tanto cuidado! E mesmo assim, foi pouco.
Não sei se te peguei da forma errada,  
                            
                              ou se já chegaste a mim demasiado fragilizada…

Não queria acreditar que, ainda agora te segurava...
Ainda agora estavas viva…
Ainda agora adormecia com o som do teu respirar…

Agora, chamo o teu nome e ninguém responde do lado de lá…
Agora, já ninguém chama o meu nome do lado de cá.

Sou casmurra. Não me dei por vencida.
Primeiro, levantei-me a mim do chão, depois, quis regressar a ti
                            e regressei à corrida.  
Recuperei-me, e estava decidida a erguer-te de novo.
Desta vez tive a tua ajuda,
                                                   estavas mais comprometida.
Tinhas esperança de ser curada.
Talvez, desta vez, não oferecesses tanta resistência!
Talvez, desta vez, aceitasses o meu amor!
Talvez, desta vez, seja um trabalho a dois!
Talvez, desta vez, possa estar mais descansada.
Talvez, desta vez, também eu possa ser cuidada.

Arrumei os pedaços, tentei dar-lhes uma outra figura.
Adequada à tua beleza, ao teu jeito e feitio. Inteligente, criativa, misteriosa, divertida, carismática, observadora, com um toque sombrio.

Despertaste em mim um amor doentio!  
Ou, pelo menos, era assim que alguns lhe chamavam.
Admito, a opinião alheia deixa-me mais aborrecida do que interessada. A pessoas incompreensivas, não tenho vontade de lhes responder. Quem entende, irá entender. Quem sente o amor como uma brisa, não sabe o que é senti-lo como um furacão. Só quem ama ou já amou assim, tem a total capacidade de compreender, que nem tudo o que parece mau, o chega realmente a ser.

Às vezes, é preciso destruir o antigo, para que algo novo tenha espaço para aparecer. Um amor assim não é uma doença, não mata, pelo contrário, deu-me vontade de viver. Fez-me querer ser melhor, fez-me lutar para que pudesse sentir-me merecedora de o ter.

Sim, pode levar-nos à loucura. Sei que, a mim, me leva ao desespero. O desespero de te querer apertar nos meus braços todos os dias. O desespero de te ter! hoje! amanhã! sempre! O desespero de viver contigo já! agora! sempre! O desespero de não poder esperar! O desespero de não conseguir seguir indiferente depois de te conhecer! O desespero de não me conseguir conter! Nem a morte me poderia conter!  
E , saber que te irei amar, muito depois de morrer.  

Quem nunca passou de brasa a incêndio, não entende a total capacidade de um fogo. Prefiro renascer das cinzas a cada lua nova, do que passar pela vida sem ter ardido.  

Já devia ter entendido, as pessoas só podem mergulhar fundo em mim se já tiverem mergulhado fundo em si. Quem vive à superfície, não sabe do que falo quando o assunto é o inconsciente.  
Se os outros não se conhecem sequer a si mesmos, então, a opinião deles deveria mesmo importar? Há muito já fui aclamada de vilã, por não ser mais do que mera gente. E, como qualquer gente, sou simples e complexa. A realidade é que, poucos são os que se permitem sentir todo o espectro de emoções humanas, genuinamente, e eu, felizmente e infelizmente, sou gente dessa.

(…)

Descobriste um oceano escondido e inexplorado.  
Um Mar que se abriu só para ti, como se fosse Moisés que se estivesse a aproximar. Um Mar que só existia para ti. Um Mar que mais ninguém via, onde mais ninguém podia nadar. Um Mar reservado para ti. Parecia que existia com o único propósito de fazer o teu corpo flutuar.  

Deste-lhe um nome, brincaste com ele, usaste-o, amassaste-o, engoliste-o
                      e, cuspiste-o de volta na minha cara.

Uma outra definição. Um Mar de água doce, com a tua saliva misturada.
Uma outra versão de mim, desconhecida, até então.  
Um outro nome que eu preferia.
Um nome que só tu me chamavas, e mais ninguém ouvia,  
Um booboo que nasceu na tua boca e veio parar às minhas mãos, e delas escorria para um sorriso tímido que emergia.

(...)

E, de onde origina a argila?
Descobri que, pode gerar-se através de um ataque químico. Por exemplo, com a água. "A água sabe."  Era o que tu me dizias.  

Era com ela que nos moldavas.
Talvez com a água doce e salgada que escorria do teu rosto
                                                   e no meu rosto caía,
                                                   e no meu pescoço secava,

enquanto choravas em cima de mim,
                                                                ­abraçada a mim, na tua cama.

Enquanto tremias de receio, de que me desejasses mais a mim, do que aquilo que eu te desejava.

“Como não podias estar mais enganada!  
Como é que não vias todo o tempo e amor que te dedicava?  
Tinhas os olhos tapados pelo medo? Como é que me observavas e não me absorvias?”

O amor tem muito de belo e muito de triste.  A dualidade do mundo é tramada, mas não me adianta de nada fechar os olhos a tudo o que existe.  

Ah! Tantas coisas que nascem de um ataque químico! Ou ataque físico, como por exemplo, através do vulcanismo ou da erosão.
Quando moveste as placas que solidificavam as minhas raízes à Terra,  
           e chegaste a mim em forma de sismo silencioso,  
mandaste-me as ilusões e as outras estruturas todas abaixo, e sobrou uma cratera com a forma do meu coração, de onde foi cuspida a lava que me transmutou. A mesma lava que, mais tarde, usei para nos metamorfosear. Diria que, ser destruída e reconstruída por ti, foi a minha salvação.
Sobrei eu, debaixo dos destroços. Só não sei se te sobrevivi. Nunca mais fui a mesma desde que nos vi a desabar.  

E, são esses dois ataques que geram a argila. Produzem a fragmentação das rochas em pequenas partículas,  
                                                   ­                                                             
                                                                ­                         umas afiadas,  
                                                      ­                                                        
                                                                ­                         umas macias,
                                                                ­                                                       
         ­                                                                 ­               todas partidas.  

Gosto de pegar em factos e, aproximá-los da ficção na minha poesia.
Brinco com metáforas, brinco contigo, brinco com a vida...mas, sou séria em tudo o que faço. Só porque brinco com as palavras, não significa que te mentiria. A lealdade que me une a ti não o iria permitir.  

É belo, tão belo! Consegues ver? Fazes vibrar o meu mundo. Contigo dá-se a verdadeira magia! Também consegues senti-la?  
Tudo dá para ser transformado em algo mais. Nem melhor nem pior, apenas algo diferente.  

Das rochas vem a areia, da areia vem a argila, da argila vem o meu vaso imaginário, a quem dei um nome e uma nova sina.  

Viva a alquimia! Sinto a fluir em mim a alquimia!  
Tenho uma capacidade inata de romantizar tudo,  

                                                   de ver o copo meio cheio,  

                                                       ­                          e nem copo existia.  

Revelaste-me um amor que não sabia estar perdido.
Entendeste-me com qualidades e defeitos.
Graças a ti, fiquei esclarecida! Que melhor do que ser amada,
é ser aceite e compreendida.

Feita de barro nunca antes fundido.
Assim seguia a minha alma, antes de te ter conhecido.
Dá-me da tua água! Quero afogar-me em ti, todas as vidas!
E ter o prazer de conhecer-te, e ter o desprazer de esquecer-te, só para poder voltar a conhecer-te,
sentir-te, e por ti, só por ti, ser sentida.  

Toquei-te na alma nua! Ainda tenho as mãos manchadas com o sangue da tua carne crua. E a minha alma nua, foi tocada por ti. Provaste-me que não estava doida varrida. Soube logo que era tua!  

Nunca tinha trabalhado com o teu tipo de barro.
Ainda para mais, tão fraturado.
Peguei em ti, com todo o cuidado...

"Tive um pensamento bizarro,
Dos teus pedaços vou construir um vaso! Tem de caber água, búzios, algumas flores! Talvez o meu corpo inteiro, se o conseguir encolher o suficiente.

Recolho todos os teus bocados, mantenho-os presos, juntos por um fio vermelho e dourado. Ofereço-me a ti de presente."

(…)

Amei-te de forma sincera.  Às vezes errada, outras vezes certa, quem sabe incoerente. Mas o amor, esse que mais importa, ao contrário de nós, é consistente.  

Sobreviveu às chamas do inferno, às chuvas que as apagaram, a dezenas de enterros e renascimentos.  

Nem os anos que por ele passaram, o conseguiram romper. Nem o tempo que tudo desbota, o conseguiu reescrever.

Foi assim que me deparei com o presente agridoce que me aguardava. Descobriste um dos vazios que carrego cá dentro e, depositaste um pedaço de ti para o preencher.
Invadiste o meu espaço, sem que te tivesse notado, nem ouvi os teus passos a atravessar a porta.  
Confundiste-te com a minha solidão, sem nunca a ter mudado. Eras metade do que faltava em mim, e nem dei conta que me faltavas.

“Como poderia não te ter amado? …"

(…)

Minha bela pedra de argila,  
Ninguém me disse que eras preciosa.
Ninguém o sabia, até então.
Não te davam o devido valor,
e, para mim, sempre foste o meu maior tesouro.
Até a alma me iluminavas,
como se fosses uma pedra esculpida em ouro.

  
Meu vaso de barro banhado a fio dourado,  
Ninguém me avisou que serias tão cobiçado,  
                                                     ­             invejado,
                                                               desdenhado,
ou, até, a melhor obra de arte que eu nunca teria acabado.
Ninguém o poderia saber.  
Queria guardar-te só para mim!
Não por ciúmes, além de os ter.
Mas sim, para te proteger.
Livrar-te de olhares gananciosos e, pessoas mal-intencionadas.  
Livrar-te das minhas próprias mãos que, aparentemente, estão condenadas
                       a destruir tudo o que tanto desejam poder agarrar.  

Perdoa-me, ter achado que era uma benção.

Talvez fosse mais como a maldição  
de um Rei Midas virado do avesso.
Tudo o que toco, transforma-se em fumo dourado.
Vejo o futuro que nos poderia ter sido dado!
Vejo-te no fumo espesso,
                                               a dissipares-te à minha frente,
antes mesmo de te ter tocado.

Tudo o que os deuses me ofereceram de presente, vinha envenenado.

  
A eterna questão que paira no ar.  
É melhor amar e perder? Ou nunca chegar a descobrir a sensação de ter amado?

É melhor amar e ficar!

Há sempre mais opções, para quem gosta de se focar menos nos problemas
                     e mais nas soluções.

O amor é como o meu vaso de argila em processo de criação.  
Cuidado! Qualquer movimento brusco vai deixar uma marca profunda. Enquanto não solidificar, tens de ter cuidado! Muito cuidado para não o estragar. Deixa-o girar, não o tentes domar, toca-lhe com suavidade, dá-lhe forma gentilmente, decora os seus movimentos e, deixa-te ser levado, para onde quer que te leve a sua incerta corrente.

Enquanto não solidificar, é frágil! Muito frágil e, a qualquer momento, pode desabar.

Era isso que me estavas a tentar ensinar?  

Duas mãos que moldam a argila num ritmo exaltante!
E une-se a argila com o criador!
                                            E gira! E gira! num rodopio esmagador,  
                                                    ­  E gira! E gira! mas não o largues!
Segura bem os seus pedaços! Abraça-os com firmeza!

Porque erguê-lo é um trabalho árduo
                                                           ­      e se o largas, vai logo abaixo!

São horas, dias, meses, anos, atirados para o esgoto. Sobra a dor, para que nenhuma de nós se esqueça.

                                        E dança! E dança! E dança!...
                             Tento seguir os seus passos pela cintura...  
                                       Se não soubesse que era argila,  
                          diria que era a minha mão entrelaçada na tua.

Bato o pé no soalho.
                                    E acelero!
                                                      e acalmo o compasso...
A água escorre por ele abaixo.
Ressalta as tuas belas linhas à medida da sua descida,
como se fosse a tua pele suada na minha.  

No final, que me resta fazer? Apenas admirá-lo.

Reconstrui-lo. Delimitá-lo. Esculpi-lo. Colori-lo. Parti-lo, quem sabe. É tão simples! a minha humana de ossos e carne, transformada em pedra de argila, transformada em tesouro, transformada em pó de cinza que ingeri do meu próprio vulcão...

A destruição também é uma forma de arte, descobri isso à força, quando me deixaste.  

Acho que, no meu vaso de argila, onde duas mãos se entrecruzaram para o moldar, vou enchê-lo de areia, búzios, pedras e água dourada,
         talvez nasça lá um outro pedaço de ti, a meio da madrugada.
Vou metê-lo ao lado da minha cama, e chamar-lhe vaso de ouro. Porque quem pega num pedaço rochoso e consegue dar-lhe uma outra utilidade, já descobriu o que é alquimia,  

o poder de ser forjado pelo fogo e sair ileso,
renascido como algo novo.
Mariah Tulli Feb 2019
Chovia a umas três horas, nada tão diferente de dias normais em São Paulo. Clara se arrumava para o trabalho com aquela pressa de quem ia perder o trem, mas na verdade era apenas a euforia pro segundo encontro com Luisa, que ia acontecer no fim do expediente. Se desesperou mais ainda quando olhou para cama e viu o tanto de roupa que havia deixado espalhada.  E se no final nós viermos para minha casa? Vai estar tudo uma bagunça, pensou ela, mas deixou assim mesmo, pois não queria criar expectativas demais, era apenas o segundo encontro e como já havia notado, Luisa parecia ser daquelas meninas meio tímidas de início. Pronto, calça preta, blusa preta e um boné vermelho que combinava com o tênis, pois em dias de chuva era necessário já que sempre perdia a sombrinha.

- Oii linda, então está tudo certo pra hoje né? Saio às 17h e prometo não atrasar. Disse clara enfatizando aquela idéia de pontualidade mais pra ela mesma do que para Luisa.
- Clara.. ops, claro rs! Te encontro no metrô perto do seu trabalho :)

Luisa tinha mania de fazer piadas com coisas bem bobas, era sua marca. Logo em seguida da mensagem enviada percebeu que mais uma vez tinha feito isso e riu de si mesma. Assim se estendeu o dia, Luisa sem muito o que fazer pois era seu dia de folga, então estava com todo o tempo do mundo para se arrumar, mas era daquelas decididas que pensava na roupa que iria vestir enquanto tomava banho e em dez minutos já estava pronta. O relógio despertou às 16h, trinta minutos se arrumando e mais trinta no metrô. Luisa estava pontualmente no local combinado, mesmo sabendo que Clara iria demorar mais um pouco ate finalizar todas as tarefas. Mais trinta minutos se passaram e nesse tempo Luisa já estava sentada em um bar ao lado da saída lateral do metrô com uma cerveja na mão, avistou aquele sorriso intenso de Clara, sorriu de volta cantarolando em sua cabeça “cê tem uma cara de quem vai fuder minha vida”, música vívida entre os jovens.

-Desculpa, te deixei esperando mais uma vez, como vamos resolver essa dívida aí? Disse clara esperando que a resposta fosse “com um beijo”.
-Sem problemas, já estou quase me acostumando, me rendi a uma cerveja, mas podemos beber outras lá em casa, o que acha?

Sem mais nem menos Clara aceitou e ficou surpresa pelo convite, a timidez percebida por ela já tinha ido embora pelo jeito. Chegando lá sentou em um colchão em cima de um pallet que ficava na sala e começou a analisar todo o ambiente, uma estante com dezenas de livros e três plantas pequenas no topo. Luisa com o tempo livre do dia deixou a casa toda arrumada e a geladeira cheia de cerveja, abriu uma garrafa e sentou-se ao lado de Clara em seu sofá improvisado.

-Posso? Pergunta Luisa ao indicar que queria passar a mão no sidecut de Clara.
-Claro, aproveita que raspei ontem.

Com a deixa para carícias, a mão ia deslizando de um lado para o outro em um toque suave na parte raspada do cabelo, até chegar ao ponto em que Clara já estava ficando um pouco excitada e gentilmente virou-se para Luisa encarou-a e sorriu, sem dizer nada, silêncio total, deixando aquela tensão pré beijo no ar por uns segundos. E sem nenhum esforço deixou que acontecesse naturalmente, sentindo aquele beijo encantador de Luisa. Pernas se entrelaçaram, corpos mais pertos um do outro, Clara acariciava lentamente o ombro de Luisa, aproveitando o movimento para abaixar a alça de sua blusa e dar um leve beijo na parte exposta, se estendendo ao pescoço, fazendo Luisa se arrepiar. Naquele momento o ambiente começa a ficar mais quente e num piscar de olhos as duas já se livraram de suas blusas. Clara volta a acariciar a pele de Luisa, mas dessa vez mais intensamente, percorre a mão pela barriga, puxa cuidadosamente a pele perto do quadril para conter o tesão, vai deslizando pela coxa, e num movimento quase imperceptível abaixa o short de Luisa e beija seus lábios molhados, fazendo-a soltar gemidos de excitação, criando um clima mais ofegante. Luisa em um mix de sensações sentiu a pulsação mais rápida de suas veias acelerado o coração, pernas tremendo e mãos suando, até perceber que aquele oral era o primeiro em que se entregava por completo, e se entregou.  Estava segura de si que aquilo era mágica e com a respiração voltando ao normal, posou um sorriso no rosto, abraçou Clara e perdurou o afago até cair no sono.
Dayanne Mendes Jul 2013
Uma caneta na mão,
Uma lágrima no rosto,
Só me restou o desgosto,
De te ver morrendo.

Não, eu não entendo,
Como cheguei aqui,
Se terei que partir,
Pra não deixar me levar pelo vento.

Não sei se ainda há tempo.
E mesmo assim não me rendo,
Nem a você,
Nem a seu amor que está me corroendo.
Tainara Oct 2016
Eu tenho o problema (ou talvez a sorte imensa) de simplesmente desgostar. De uma hora para outra, deixo de sentir o que sentia, olho para o rosto de uma pessoa que antes me causava borboletas e meu coração não bate nem mais rápido, nem mais lento, muito menos pula uma batida. O que antes me fazia sentir como se estivesse olhando diretamente para dentro de uma supernova, agora mais parece fitar um muro inacabado. Não me ficam marcas, dores, nem muita saudade; não da pessoa em si, ao menos: a única falta que sinto é de sentir.
Rui Serra Jan 2014
Percorro a cidade sem nome
por entre a multidão
à procura de . . .
Sem rosto nem emoção
Transponho o muro e caio no abismo
percorro as vielas sem rumo nem destino
Abalo entoando uma canção de corpo pendente
Possuído pela sombra do vício presente.
Rui Serra Jul 2014
tu
Estou na margem... Para lá do abismo.
Longe de mim ficaram os momentos que vivi à beira-mar. Mais longe, como uma visão, o teu rosto vindo do céu, esses lábios que não são do ser que nunca fostes e que eu beijei ao esquecer-me de beijar. Tua mão desdobra meus dedos, dobrados pelo tempo. Se o que sou não sinto, o que sinto e sou não importa.
Rui Serra Apr 2015
estranho

esta cidade
a sua personalidade
o seu cheiro

a minha casa
os meus lençóis

estou atrasado

o sol saúda as minhas cortinas
quero dormir para acordar

sorrio

água escorre pela bacia

paro no tempo

observo o teu dormir
um suave rosto

fazes o meu dia ter sentido

amo-te, mulher, minha mulher

café da manhã

há na minha mesa burocratas

sinto o teu respirar
só para mim

adormeço, recomeço

— The End —