Sob o manto ruído de um Deus ausente
Lateja a angústia, febril e fria
Vértice roto de um tempo doente
Onde o pranto apodrece em agonia.
O pulso clama, veias em flor,
Rios carmim a tingir o abismo
Cada corte um verso, cada dor
Uma elegia ao próprio exorcismo
O silêncio sangra, grita, ecoa
Voz de um mundo que nunca existiu
E a carne, espectro que a morte entoa
É ruína viva de um céu senil
A lâmina é dócil, quase divina
Traça epitáfios na pele em brasa
E o sangue, relíquia de dor vespertina
Brota insepulto, sem cruz, sem casa
Mas há um horror pior que o fim
Seguir exangue, inerte, inerme
Ser o cadáver dentro de mim
E nunca, jamais, estar realmente em morte.