Escrevo esta fábula em forma de poema,
Na tentativa que seja mais fácil de a recordar.
Agarro numa folha e desenho algumas letras,
Penso em dois animais que nos possam caracterizar.
E assim, começa, como é suposto qualquer fábula começar:
Era uma vez um leão
Perdido na floresta.
Os homens que o viam, fugiam...
Pobre leão! que fizeram que ti uma besta,
Condenaram-te ao exílio,
Sem terem qualquer razão.
Idiotas! Que já nem diferenciam
Um animal a rugir de medo
De uma besta humana
Que foge dele em desespero.
Andou meses e meses
Às voltas, desorientado,
No meio da extensa vegetação.
Não havia uma voz que o guiasse,
Não havia uma alma amiga que lhe esticasse a mão.
Só ele conhece e sente o horror
de ser chamado de predador.
Ouvir mais gritos do que risos,
Levar mais pancada do que amor.
Só quem o conhece sabe que não o faz por mal.
Faz sim, por sobrevivência, por instinto natural.
Pobre leão!
Nessa floresta,
Desencantada,
Por qualquer trilho que andava
Só encontrava a solidão…
Num belo dia de chuva,
Caída como que por compaixão,
Espreitou uma pequena aranha
Através do denso pêlo do leão.
Arrastada pelo vento,
Para sua maior alegria ou desalento,
Foi no seu pêlo que, ela, decidiu pousar.
Terá visto, no leão,
Um porto seguro
Para se refugiar?
Tinha medo da chuva?
Ou era nele que se queria hospedar?
Habituado a estar sozinho,
Forçosamente isolado,
Este pobre leão cansado,
Ao mínimo toque da aranha
Saiu a correr disparado…
Não estava habituado
A ter companhia.
Aquela doce aranha,
Que nem por um segundo o largou,
Entendeu porque é que ele a temia...
Decidiu correr a seu lado e,
Como se fosse pura magia,
Fez brotar no leão
As sensações que há muito ele desligou.
Foi o ceder do coração,
O reavivar das memórias,
Que logo o abrandou.
Quando se encontraram,
Um ao outro,
Entrelaçados num olhar,
Não foram precisas
Quaisquer palavras
Para lhes revelar:
Que apesar de qualquer diferença que possam encontrar,
ambos têm o mesmo tamanho
No que toca ao Amor
Que ambos têm
Para dar.
A aranha sobe ao seu ouvido,
Para lhe poder murmurar:
“Calma, meu pequeno leão,
Sei que estás cansado,
Ferido e traumatizado...
Nunca foi minha intenção te assustar.
Não me temas, nem me afastes!
Não pretendo deixar-te desamparado,
Estou aqui para te curar.
Segue-me tu, agora,
Tenho um lugar para te mostrar…
O sítio perfeito
Onde vais conseguir descansar.”
O caminho era longo, mas pareceu-lhe menos demorado,
Só porque caminhavam lado a lado.
E quando chegou ao destino,
Ou quando o destino se foi com ele esbarrar,
O leão nem conseguiu acreditar
Que naquela floresta,
Muito menos solitária,
Era exatamente
Onde ele precisava de estar…
O tal destino,
Já traçado,
Assim o veio relembrar
Que às vezes é preciso se perder,
Para mais tarde,
Se reencontrar.
Nessa mesma noite,
A floresta parecia encantada.
Só se ouvia
dois corações
a bater em sintonia.
Pum…pum…pum...pum…
Só se viam
Duas almas nuas
Deitadas e embaladas
Numa teia perfeitamente desenhada.
Quem se atreve a dizer que o leão pertence à savana?
Anda esta gente toda enganada!
Nunca leram a pequena história
Do leão e da aranha.
E quem a ler, talvez dirá, que história mais estranha!