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Victor Marques Jun 2010
A solidão espalha os seus frutos

Sou um ser controverso,
Com pena e verso.
Eu tenho uma vida,
Bem ou mal vivida.


A vida é um flagelo,
Um trovão descontrolado,
Um amor mal amado,
Um fio fino dum cabelo.



Coisas lindas eu já vi,
Muitas nem senti,
Existe por vezes beleza,
No pousar da natureza.


Na solidão e melancolia,
Vivo o dia-a-dia,
Gosto de amar de sentir saudade,
Caminheiro da liberdade.
Victor Marques
- From Me...
Amarantine Apr 2015
A escrita está mapeada
na alma dos que se desesperam,
dos que sentem,
dos que querem expressar
o que as palavras-ditas não conseguem.

A escrita é uma dádiva divina.
Uma espécie de abrigo
para refugiarmo-nos.
A melhor árvore para pousar
quando as asas estão cansadas.
Mariana Seabra Mar 2022
Escrevo esta fábula em forma de poema,

Na tentativa que seja mais fácil de a recordar.

Agarro numa folha e desenho algumas letras,

Penso em dois animais que nos possam caracterizar.

E assim, começa, como é suposto qualquer fábula começar:



Era uma vez um leão

Perdido na floresta.

Os homens que o viam, fugiam...

Pobre leão! que fizeram que ti uma besta,

Condenaram-te ao exílio,  

Sem terem qualquer razão.

Idiotas! Que já nem diferenciam

Um animal a rugir de medo

De uma besta humana  

Que foge dele em desespero.  



Andou meses e meses  

Às voltas, desorientado,  

No meio da extensa vegetação.

Não havia uma voz que o guiasse,

Não havia uma alma amiga que lhe esticasse a mão.



Só ele conhece e sente o horror  

de ser chamado de predador.

Ouvir mais gritos do que risos,  

Levar mais pancada do que amor.

Só quem o conhece sabe que não o faz por mal.

Faz sim, por sobrevivência, por instinto natural.





Pobre leão!  

Nessa floresta,  

Desencantada,

Por qualquer trilho que andava

Só encontrava a solidão…



Num belo dia de chuva,

Caída como que por compaixão,

Espreitou uma pequena aranha

Através do denso pêlo do leão.



Arrastada pelo vento,

Para sua maior alegria ou desalento,

Foi no seu pêlo que, ela, decidiu pousar.



Terá visto, no leão,

Um porto seguro

Para se refugiar?





Tinha medo da chuva?  

Ou era nele que se queria hospedar?



Habituado a estar sozinho,

Forçosamente isolado,

Este pobre leão cansado,

Ao mínimo toque da aranha

Saiu a correr disparado…



Não estava habituado

A ter companhia.



Aquela doce aranha,

Que nem por um segundo o largou,

Entendeu porque é que ele a temia...

Decidiu correr a seu lado e,

Como se fosse pura magia,

Fez brotar no leão  

As sensações que há muito ele desligou.



Foi o ceder do coração,

O reavivar das memórias,

Que logo o abrandou.



Quando se encontraram,

Um ao outro,

Entrelaçados num olhar,

Não foram precisas  

Quaisquer palavras

Para lhes revelar:

Que apesar de qualquer diferença que possam encontrar,

ambos têm o mesmo tamanho

No que toca ao Amor

Que ambos têm  

Para dar.



A aranha sobe ao seu ouvido,

Para lhe poder murmurar:

“Calma, meu pequeno leão,

Sei que estás cansado,

Ferido e traumatizado...

Nunca foi minha intenção te assustar.

Não me temas, nem me afastes!

Não pretendo deixar-te desamparado,

Estou aqui para te curar.

Segue-me tu, agora,  

Tenho um lugar para te mostrar…

O sítio perfeito

Onde vais conseguir descansar.”



O caminho era longo, mas pareceu-lhe menos demorado,

Só porque caminhavam lado a lado.



E quando chegou ao destino,

Ou quando o destino se foi com ele esbarrar,  

O leão nem conseguiu acreditar

Que naquela floresta,

Muito menos solitária,

Era exatamente  

Onde ele precisava de estar…



O tal destino,  

Já traçado,

Assim o veio relembrar

Que às vezes é preciso se perder,

Para mais tarde,

Se reencontrar.



Nessa mesma noite,

A floresta parecia encantada.

Só se ouvia  

dois corações

a bater em sintonia.  

Pum…pum…pum...pum…

Só se viam  

Duas almas nuas

Deitadas e embaladas

Numa teia perfeitamente desenhada.



Quem se atreve a dizer que o leão pertence à savana?

Anda esta gente toda enganada!

Nunca leram a pequena história

Do leão e da aranha.



E quem a ler, talvez dirá, que história mais estranha!
Mariana Seabra Mar 2022
Deixo de herança todos os pensamentos

Perdidos ao luar,

Escritos na página invisível da vida,

Impossíveis de partilhar.



Deixo de herança todas as garrafas,

Que esvaziei e pousei à beira-mar,

Com uma carta escondida lá dentro,

Incógnita ainda por entregar.



Deixo de herança todo o fumo,

Que compulsivamente inalei

Para tentar matar a doença

Da qual nunca me curei.



Deixo as pegadas na areia,

Que rapidamente se apagaram.

Marcas da efémera passagem dos seres

Que por mim passaram.



Deixo de herança o sol de inverno,

Tão apreciado por toda a gente.

Desejo que aqueça as almas frias,

Que não deixe ninguém indiferente.





Deixo de herança o incenso

Que nunca acendi.

Espalhado pela brisa,

Como qualquer cheiro que senti.



Deixo de herança toda a música

E cada marca que deixou.

Atenciosa companheira,

Que tantas vezes me salvou.



Deixo de herança o rio,

No seu mesmo exato lugar.

Lembrança eterna que existe um sítio seguro

Para onde o desespero nos pode levar.



Deixo de herança a pedra afiada,

Que me esculpiram no lugar do coração.

Memória da crueldade no olhar

De quem a infância me roubou.



Deixo ligadas as luzes da aldeia,

Que me abrigaram no solitário berço.

Agarro o impulso que me levou à procura

De tudo o que ainda desconheço.

  



Deixo de herança em papel amarrotado,

Algum sangue que derramei.

Lágrimas, cicatrizes e o fardo,

De ser tão brutalmente consciente

De tudo aquilo que sei.



Deixo de herança o meu amor,

Sorrisos, abraços e essências,

Partilhadas no pôr-do-sol.

E que nesta viagem de turbulências,

Repares na simplicidade do sentimento

Que achaste saber de cor.



Deixo de herança uma moeda,

Ao pedinte que conheci

E que nunca a chegou a gastar.

Esqueceu-se que para a salvação da vida

Não há dinheiro, nem há fornecedor

Onde ele a possa ir comprar.



Deixo de herança o pássaro branco,

Que ainda não se atreveu a pousar.

Canta mais alto a cada Primavera,

Só para me relembrar,

Que as raízes são uma ilusão

Criadas por quem não as consegue descolar.





Deixo de herança duas mãos quentes,

No peito frágil de uma criança,

Que nasceu órfão de mãe

E cresceu sem esperança.


“Nas noites escuras que te abraçam.

Nos dias cinzentos a que te entregas

Que sintas neste aperto a mensagem

De toda a força que carregas.”




Deixo de herança este poema,

Escrito num sonho que se entranha

E do qual nunca acordei.

Vem…

Traz o mapa que queimei.

E encontra-me para lá da montanha

Onde também eu me encontrei.

— The End —